Com seu vasto território agrícola e a abundância de recursos naturais, o Brasil continua a despertar um grande interesse por parte dos investidores estrangeiros. No entanto, quando se trata de adquirir ou alugar terras rurais, o país adota uma abordagem cautelosa e cada vez mais rigorosa. Nos últimos anos, essa questão voltou a ser um tema central no debate jurídico, político e econômico.
Compreendendo o panorama jurídico
Desde a década de 1970, o Brasil impõe restrições ao acesso de estrangeiros às terras rurais para proteger a soberania nacional e os recursos estratégicos. O marco jurídico, estabelecido principalmente pelas leis nº 5.709/1971 e nº 8.629/1993, limita a capacidade de pessoas estrangeiras, entidades estrangeiras e empresas brasileiras sob controle estrangeiro de adquirir ou alugar propriedades rurais.
Essas operações frequentemente necessitam de aprovação prévia de órgãos governamentais, como o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), e devem seguir uma série de procedimentos legais. O descumprimento dessas regras pode resultar na anulação da transação, representando um risco significativo para os investidores que não estão cientes das complexidades jurídicas.
Pressão por reformas e desenvolvimentos judiciais
Embora as leis permaneçam inalteradas, há uma crescente pressão por reformas. O projeto de lei nº 2.963/2019, atualmente em análise no Congresso, visa flexibilizar as restrições impostas às empresas brasileiras com capital estrangeiro. Paralelamente, dois casos importantes no Supremo Tribunal Federal (ADPF 342 e ACO 2.463) questionam o parecer jurídico vinculante que atualmente aplica as restrições existentes.
Uma decisão em qualquer um dos casos poderia remodelar o quadro jurídico, ampliando ou limitando o acesso de estrangeiros às terras rurais.
Contornos Legais: Estruturas e Estratégias
Embora a legislação brasileira não defina a aquisição e locação de propriedades rurais por estrangeiros, para contornar essas restrições, consultores jurídicos e empresariais desenvolveram estruturas alternativas que permitem a participação de estrangeiros em operações rurais sem serem diretamente proprietários. Do ponto de vista imobiliário, os mecanismos comuns incluem direitos de superfície, cessão de uso, acordos de usufruto e parcerias rurais, todos projetados para garantir que o controle do uso da terra permaneça conforme a lei.
Do ponto de vista empresarial, os investidores frequentemente recorrem a modelos de duas empresas: uma “LandCo” (uma empresa controlada pelo Brasil que possui legalmente as terras) e uma “OperationalCo” (uma empresa controlada pelo estrangeiro que gerencia a produção agrícola). Quando corretamente estruturada, essa separação entre propriedade e operação pode ser eficaz, mas deve respeitar formalidades rigorosas para evitar ser considerada uma simulação ou contorno da lei.
Ações judiciais em crescimento
Vale mencionar que essas estruturas alternativas para superar as restrições – que funcionaram bem – foram recentemente contestadas em alguns processos de interesse público, sob a alegação de serem estruturas empresariais “simuladas”. Se os tribunais confirmarem esses argumentos, muitas transações passadas e presentes poderiam ser consideradas nulas, o que poderia perturbar um amplo segmento do setor agroalimentar brasileiro.
O que aguarda os investidores estrangeiros
Embora a lei não tenha mudado, a interpretação judicial está evoluindo. Uma mudança na forma como os tribunais definem o “controle estrangeiro” – especialmente de forma indireta ou societária – poderia colocar em risco estruturas de investimento amplamente utilizadas.
Os investidores estrangeiros e os atores da agroindústria devem ser proativos: realizar verificações jurídicas aprofundadas, manter-se atualizados sobre as evoluções legislativas e judiciais e explorar soluções sólidas e conformes para garantir sua presença a longo prazo na economia rural brasileira.
Manucci Advogados tem acompanhado de perto a evolução dessa questão e está pronto para ajudar seus clientes a avaliar os riscos e tomar decisões sobre as estruturas de aquisição e/ou locação de propriedades rurais no Brasil.